terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Saudade

"É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
as folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir
como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te".

(Mario quintana)

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Que venha 2011

Virada de ano mexe com a gente. Muda apenas um número no calendário, dizem alguns, tentando ignorar a força da passagem, da transição. O calendário marca etapas, fecha ciclos e abre outros tornando a vida circular e não uma estrada reta, contínua e monótonoma.
Um ano termina, fim de uma etapa. 2011 começa a despontar no horizonte trazendo inúmeras possibilidades... podemos recomeçar, fazer novas escolhas, renovar ou reafirmar aquilo que ainda faz algum sentido, descartar o que ja não nos cabe mais, guardar só o que vale a pena, só o que não pesa na memória, aquilo que não deixa nosso corpo máquina lenta e pesada. Viver exige muito espaço e energia ... bom mesmo é liberar a memória para se criar novos arquivos em 2011.
Aproveitemos essa última sermana do ano para deletar, arquivar e abrir espaços para o novo. Renove-se, encha-se de esperança - misto de espera e confiança no que há de vir.
Que a Deusa Sabedoria, Huáh Santa, encontre espaço para fazer morada em nós e seja inspiração para construção desse novo ano que vem por ai.

Para aqueles e aquelas que crêem...


"Amanhã será um lindo dia, da mais louca alegria

Que se possa imaginar, amanhã redobrada a força

Pra cima que não cessa, há de vingar

Amanhã mais nenhum mistério, acima do ilusório

O astro rei vai brilhar, amanhã a luminosidade

Alheia a qualquer vontade, há de imperar, há de imperar

Amanhã está toda a esperança por menor que pareça

O que existe é pra festejar, amanhã apesar de hoje

Sera a estrada que surge pra se trilhar

Amanhã mesmo que uns não queiram será de outros que esperam

Ver o dia raiar, amanhã ódios aplacados temores abrandados

Será pleno, será pleno..."

Que seja plena a nossa alegria em 2011. Feliz Ano Novo !!!

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Mensagem de Natal



Que bons ventos soprem sobre você a paz necessária para fazer do Natal um momento de celebração da vida e do amor...

Que 2011 seja para ti uma porta aberta cheia de possibilidades de realizações. Que os teus desejos e sonhos sejam renovados e sirvam de horizonte para o teu caminhar.



terça-feira, 14 de dezembro de 2010

É o que me interessa - Lenine


Daqui desse momento                                  
Do meu olhar pra fora
O mundo é só miragem
A sombra do futuro
A sobra do passado
Assombram a paisagem.

Quem vai virar o jogo
E transformar a perda
Em nossa recompensa
Quando eu olhar pro lado
Eu quero estar cercado
Só de quem me interessa.

Às vezes é um instante
A tarde faz silêncio
O vento sopra a meu favor
Às vezes eu pressinto e é como uma saudade
De um tempo que ainda não passou
Me traz o seu sossego
Atrasa o meu relógio
Acalma a minha pressa
Me dá sua palavra
Sussurra em meu ouvido
Só o que me interessa.

A lógica do vento
O caos do pensamento
A paz na solidão
A órbita do tempo
A pausa do retrato
A voz da intuição
A curva do universo
A fórmula do acaso
O alcance da promessa
O salto do desejo
O agora e o infinito
Só o que me interessa.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Se nada mais der certo


Esse é o título de um filme brasileiro que assisti ontem meio por acaso. Não gosto de comentar filme porque considero a percepção sobre o mesmo algo bem pessoal e, no caso desse filme, seria redundante uma vez que ele tem um site próprio bem produzido com todas as informações tecnicas, trilha sonora, imagens...
Pra quem gosta de filmes nacionais fica a indicação. Eu gostei!


"Qual é a lógica do pobre quando rouba o rico?O pobre rouba o rico porque quer ter o que ele não tem. Qual a lógica do rico quando rouba o pobre se ele ja tem tudo? A gente é educado pra não roubar, mas não é educado pra não ser roubado."

"Se não existe milagre existe uma outra coisa que sempre nos traz à vida se nada mais der certo..."

Poema de Hilda Hilst:

"Colada à tua boca a minha desordem.
O meu vasto querer.
O incompossível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas descomedida
Árdua
Construtor de ilusões
examino-te sôfrega
Como se fosses morrer colado à minha boca.
Como se fosse nascer
E tu fosses o dia magnânimo

Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer".


http://www.senadamaisdercerto.com.br/

"Fora de Mim" Martha Medeiros

Não sei se as pessoas choram de forma diferente umas das outras, eu choro contraída, como se alguém estivesse perfurando minha alma com uma lâmina enferrujada, choro como quem implora, pare, não posso mais suportar, mas o insuportável é uma medida que nunca tem limite, eu chorei no domingo, na segunda, na terça, em várias partes do dia e da noite, um choro de quem pede clemência, de quem está sendo confrontado com a morte, eu estava abandonando uma vida que não teria mais, eu sofria minha própria despedida, morte e parto, eu tinha que renascer e não queria, não quero, sinto que caí num vácuo, perdi a parte boa da minha história, e não quero outra, enquanto choro penso que se alguém me visse chorar dessa maneira me salvaria, prestaria socorro, chamaria uma ambulância, eu nunca vi você chorar, você alguma vez chorou por mim, você sofre a minha ausência, sente minha falta? Estar sozinha nessa aflição me condói de mim mesma, é o labirinto do inferno, não há saída, não há saída, você não está me esperando lá fora, nem hoje, nem amanhã, você não vai fazer nenhum gesto para me resgatar, e se fizesse, eu não estenderia minha mão, e é isso que me faz descrer de tudo, eu sei que acabou, eu estava infeliz ao seu lado, eu estou infeliz sem você, mentira, eu era feliz ao seu lado, e nem sei se a palavra é essa, feliz. Felicidade é um resumo fácil, uma preguiça de investigar o muito mais que nos ergue diariamente, na época era o que me bastava, eu sabia onde estava e com quem, eu não estou infeliz, eu só estou perdida e não consigo mandar nenhum S.O.S., ninguém sabe onde estou, largaram meu corpo em cima dessa cama e ninguém me procura.

Choro, choro muito, choro agora feito uma guitarra dedilhada por um bêbado, sinto uma piedade inconsolável de mim, de tanto que recordo o quanto te quis e o quanto te admirei por amares a mim, era paixão inveterada, paixão de doer, paixão de não dar certo mesmo, paixão de perder o tino, e perdi por completo, hoje tento compreender duas ou três frases e nem isso me cabe, ficou tudo sem lógica, eu que prezo tanto a lógica, não entendo mais nada, mergulhei no escuro da minha perplexidade, você era meu até bem pouco tempo, mas vou sair dessa, veja, já estou enxugando as lágrimas, procurando meu celular para fazer uma ligação qualquer, esses compromissos que a gente inventa para fingir que a vida continua. Marquei hora no cabeleireiro sem ter motivo algum pra ficar bonita.


(...)

No segundo dia eu sumi com sua escova de dente, que ficava ao lado da minha, as duas grudadas de forma indecente, como nunca mais ficaremos, tirei a sua de perto, mas não tive coragem de jogá-la fora, abandonei-a numa gaveta na esperança de que você viesse um dia e não veio. Hoje a peguei entre as mãos e cheirei as cerdas em busca de um resto de saliva sua, do odor da sua boca, e me senti estúpida e digna de pena, joguei na lixeira sua escova e fiquei me sentindo um pouquinho pior, porque nada me serve, nenhum ato que pareça maduro é maduro de fato, mas o que me resta? Tenho que faxinar você da minha vida, não posso permitir o atrevimento de você estar aqui sem estar aqui. Não ouço mais música, todos os discos foram escutados em sua presença, nas nossas noites e também ao acordar, a casa sempre sonorizada, você não gostava de silêncios, nunca estive com você sem que houvesse música e isso agora me intriga: por que o silêncio te incomodava tanto? Nas nossas viagens, música, música, muita música, e quando a estrada era longa às vezes eu cansava do barulho, diminuía o volume ou desligava o som e você reagia, e eu sigo desligando, interrompendo as músicas que ouvíamos na sala, no carro, pois cada verso, cada letra, é de mim que falam, da sua ausência, da minha dor, do seu novo amor.  (...) Você era perdulário com as palavras, não havia um único dia em que eu não escutasse de você o quanto me amava, dizia no meu ouvido ou através de bilhetes, te amo, te amo, como é que você fez para incinerar todo esse amor em tão pouco tempo, onde o escondeu, em algum guarda-volume de rodoviária, enterrou em algum matagal, como é que seu amor foi desaparecer sem deixar pista, rastro, feito um crime perfeito?
A primeira vez que eu disse que te amava foi depois de uma transa, uma das nossas primeiras, e eu me surpreendi com o que havia dito, porque ao contrário de você, sou econômica nas declarações, mas as palavras saíram de mim como num gozo, sem controle, eu mal te conhecia e de dentro de mim saiu aquele te amo com uma voz que era a minha, porém num tom mais leve e de uma sinceridade que me comoveu, te amo, e também nunca mais parei, e nunca vou parar, te amo e quero te matar, queria que você evaporasse, onde é que eu te incinero, te escondo, te enterro, me conta onde fica esse esconderijo secreto, o mesmo onde você sumiu com todos os eu te amo que me disse.

"Fora de Mim" Martha Medeiros

Eu sabia que terminaríamos, eu sabia que era uma viagem sem destino, sabia desde o início e não sabia, não sabia que doeria tanto, que era tanto, que era muito mais do que se pode saber, ninguém pode saber um amor, entender um amor, tanto que terminou sem muito discurso, foi uma noite em que você quase pediu, me deixe. Ora, pra que me enganar: você realmente pediu, sem pronunciar palavra, você vinha pedindo, me deixe, olhe o jeito que te trato, repare em como não te quero mais, me deixe, e eu, de repente, naquela noite que poderia ter sido amena, me vi desistindo de um jantar e de nós dois em menos de dez minutos, a decisão mais rápida da minha vida, e a mais longa, começou a ser amadurecida desde o dia em que falei com você pela primeira vez, desde uma tarde em que ainda nem tínhamos iniciado nada e eu já amadurecia o fim, e assim foi durante os dois anos em que estivemos tão juntos e tão separados, eu em constante estado de paixão e luto, me preparando para o amor e a dor ao mesmo tempo, achando que isso era maturidade. Que idiota eu sou, o que é que amadureci?

Nada, nem a mim mesma, jamais deixei de ter 10 anos, nem quando tive 30, nem quando fiz 40. Nunca tive idade, ela de nada me serviu, ser lúcida sempre foi apenas uma maneira de parecer elegante, uma estratégia para a convivência. Você lembra como eu chorei aquela noite, lembra do fim, você não pode ter esquecido aquela cena, entramos em casa sem acender as luzes, você olhando para fora da janela enquanto eu derramava toda a minha frustração e meu desespero, como se a culpa fosse minha e não sua, ou fosse sua e não minha, como se existisse culpa para o término de um relacionamento que simplesmente não tinha mais combustível, nem mais estrada. (...) quanto tempo faz, 15 minutos, vinte minutos desde que você saiu aqui de casa? Eu ainda estava quieta agora há pouco, eu ainda estava sem pensar e sem sentir, de repente me deu uma calma, nenhuma desgraça aconteceu, você desceu pelas escadas, eu fechei a porta do apartamento e não chorei mais, eu vi pela janela o seu carro saindo da garagem e não chorei, eu fui para o banheiro escovar os dentes, acho que escovei os dentes, não lembro, e botei uma camisola e fui pra cama e não chorei, não pensei, não senti, não chorei, entendi, não entendi, não pensei, não sei, acho que dormi.

Você não ligaria no dia seguinte, era domingo, fui até a cozinha lavar a louça, mas não havia louça para lavar, o combinado era jantarmos fora na noite anterior, não jantamos, ninguém se alimentou, quanto tempo faz desde aquela noite, parece um século, foi ontem. Decidi seguir a rotina: o que eu fazia aos domingos de manhã?

Eu caminhava, eu ia ao parque, então caminharei, mas falta você, coloquei o tênis, saí a pé de casa, falta você e não falta, o estrondo está diminuindo, o barulho cessou, será que eu já percebo o acidente? Dou uma volta no parque, duas voltas, três voltas, você não virá aqui me ver? Volto. Telefono pra minha mãe, não telefono pra você, conto pra ela que acabamos, meu relato é muito coerente, ela lamenta mais ou menos, já ouviu eu contar essa história antes, somos reincidentes em finais, mas agora é pra valer, quem me acredita? Eu não me acredito, mas agora não te quero mesmo, e eu já ouvi isso antes, de você, de mim, agora não tem mais volta – dei tantas voltas no parque, é tão ridículo caminhar pra lugar nenhum, para quem vou ficar magra e saudável? E voltei a dizer: não, mãe, acabou de verdade, e pela primeira vez reparei em minha voz tremida, pela primeira vez naquele domingo eu fraquejei, as palavras saíram entrecortadas, eu catava as sílabas que me fugiam, e ela do outro lado da linha fingia que não doía nela também.

Liguei o computador, escrevi, que é como organizo meu pensamento, escrevi e parecia que eu estava ditando a mim mesma um texto requentado, agora acabou, agora é comigo, sei que vou conseguir, tenho meus motivos, e me dei várias explicações, tentei me convencer, eu estava tão racional, tão genial, eu quase consegui, e não almocei, zanzei pela casa, tomei um banho, troquei de roupa, tirei suas fotos dos porta-retratos e desabei pela segunda vez, a primeira sem que você testemunhasse.

Guardei na gaveta aquela fotografia em que você estava de boné, parecia um garoto, me agarrando pela cintura. Guardei todas. Aquela outra, nós dois, eu de novo enlaçada por você. E uma de você sozinho, um flagrante, você não percebeu, bati a foto enquanto você lia o jornal, tão lindo, você era tão lindo, você ainda é o mesmo homem depois de ontem, o mesmo homem sem mim? Eu me olho no espelho e não me enxergo, não sou mais a mesma, perdi a identidade. Tirar suas fotos de vista me pareceu uma providência curativa, agora você não o verá mais, querida, vai esquecê-lo mais rápido, como somos inocentes. E eu lá quero esquecê-lo? Sua presença ainda está tão quente dentro desse apartamento, o colchão ainda está meio afundado do lado em que você dormia.


 Martha Medeiros
Trecho do livro Fora de mim (Editora Objetiva, 126 págs.)

sábado, 27 de novembro de 2010

Brindis - Soledad Pastorutti




Seguir siguiendo al corazón
y coquetear con la intuición
seguir creciendo y esquivando las rutinas
seguir soñando en un rincón
seguir creyendo que hay un Dios
que me endereza de un tirón la puntería
Siempre me voy detrás de lo que siento
cada tanto muero
y aquí estoy
tantos desiertos que crucé
tantos atajos esquivé
tantas batallas que pintaron mis heridas
tantos incendios provoqué
tantos fracasos me probé
que no me explico como canto todavía
y es que siempre voy detrás de lo que siento
cada tanto muero
y aquí estoy
por esos días por venir
por este brindis para mi
por regalarle a la intuición el alma mía
porque los días se nos van
quiero cantar hasta el final
por otra noche como esta doy mi vida
tantos festejos resigné
tantos amigos extrañé
tantos domingos muy lejos de mi familia
tantas almohadas conocí
tantas canciones me aprendí
que los recuerdos me parecen de otras vidas
siempre me voy detrás de lo que siento
cada tanto muero
y aquí estoy
tantas palizas esquivé
tantas traiciones me compré
tantos enojos me hicieron mostrar los dientes
con mil abrazos me cuidé
con mil amores me curé
juntando heridas sigo creyendo en la gente
siempre voy detrás de lo que siento
cada tanto muero
pero hoy no
por esos días por venir
por este brindis para mí
por regalarle a la intuición el alma mía
porque los días se nos van
quiero cantar hasta el final
por otra noche como esta doy mi vida
y en esas noches de luna
donde los recuerdos son puñal
me abrazo a mi guitarra
y canto fuerte mis plegarias
y algo pasa, pero ya nada me hace llorar
yo me abrazo a mi guitarra
y canto fuerte mis plegarias
y algo pasa, pero ya nada me va a cambiar.


quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Mulheres de Edward Hopper














Edward Hopper (22/07/1882 a 15/05/1967) , pintor norte-americano famoso por retratar a solidão e a melancolia do cotidiano de uma sociedade marcada pelos efeitos da Segunda Guerra Mundial.
Para maiores informações visitar o site:  http://www.hopper.com.br/

Tristeza

Tristeza é algo que não se deseja, que não se sonha, que não se busca, não é um ideal que almejamos, felicidade, sim.
A tristeza é aquela visita indesejada que chega sem avisar e vai invadindo o seu espaço até tomar conta de tudo. Dependendo da  recepção e do trato que damos à ela, pode ficar algumas horas, dias, meses, anos ou até fazer morada em nós.
Li recentemente algo do tipo: "voce não pode evitar que o pássaro da tristeza pouse sobre sua cabeça, mas pode impedi-lo de fazer ali o seu ninho".
Por isso, quando a tristeza se aproximar o melhor é não ser gentil com ela, tampouco aconselho a ser indiferente pra que ela não volte outro dia ainda mais amargurada.
Eduard Hopper, pintor que gosta de retratar cenas de melancolia, diz  que pra se sentir alegria é preciso compreender a tristeza. Porque toda emoção altera nossa forma de pensar e interpretar. Ele afirma que, em última análise, a tristeza é um estado emocional complexo que nos ajuda a definir nossos conceitos e valores fundamentais.


Rubem Alves ao falar sobre o tema cita a teóloga Dorothee Sölle para quem "a presença divina nunca é presença observadora: a presença divina é sempre dor ou alegria de Deus. Mas, o que distingue a tristeza divina das tristezas do mundo? pergunta o apóstolo dos gentios. Tristeza do mundo é tristeza que gira em torno de si mesma, patina sem sair do lugar. É tristeza que paralisa no remorso, na lástima, no mórbido ruminar as faltas passadas, na lamuria sem fim. Nada se transforma, nada se metamorfoseia, nada muda. É tristeza que não conhece a esperança, o futuro, por estar afogada no passado. É Tristeza que mata, que corrói, que faz adoecer. Como exemplo, atente-se às tristezas próprias do mundo da aparência: a anorexia, a bulimia, sofrimento de um corpo que morre para parecer belo. Ou a tristeza do consumo: esse mal-estar diabólico que leva do nada a lugar nenhum. A tristeza da guerra, da destruição que faz morrer a palavra e perpetua o ódio.
A tristeza segundo Deus, porém, produz mudança, movimento, superação, transformação, produz vida. É tristeza que não patina nas culpas, mas avança na responsabilidade. Tristeza de parturiente, que traz a esperança e o futuro no ventre. É tristeza que gera a sagrada ira, a santa indignação, o grito, a libertação."


Em tempos onde se vende a felicidade como um bem de consumo e cujo modelo de "sucesso na vida" é um sorriso do tipo propaganda de creme dental, é bom saber que um pouco de tristeza e melancolia não faz mal a ninguém.

Musica pra viver melhor

Dizem que "quem canta seus males espanta"... discordo apenas no "seus".
Quem canta espanta os seus próprios males e os de quem ouve também.
Agora, quem canta
e canta afinadinho
e se deixa acompanhar por outras vozes,
por corpos e instrumentos ritmados
e sabe escolher a canção...
Não apenas espanta os males como também
Faz um bem danado!!!
Uma canção bem cantada é como uma porção de vida espalhada por ondas sonoras.
Bom mesmo é a gente se deixar tocar por ela de vez em quando pra viver com melhor vibração.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Canção de ninar para Victor, meu negrito.

Huáh, manda, manda seu ventinho
Uma brisa de carinho
Vem me tocar.



Que a vida nos possibilite momentos de simplicidade, conforto e segurança como o som de uma canção de ninar antes do adormecer ... Boa semana!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Me desordeno, amor, me desordeno

Carilda Oliver Labra
(Matanzas, 1924)

Me desordeno, amo
Me desordeno, amor, me desordeno
cuando voy en tu boca, demorada;
y casi sin por qué, casi por nada,
te toco con la punta de mi seno.

Te toco con la punta de mi seno
y con mi soledad desamparada;
y acaso sin estar enamorada
me desordeno, amor, me desordeno.

Y mi suerte de fruta respetada
arde en tu mano lúbrica y turbada
como una mala promesa de veneno;

y aunque quiero besarte arrodillada,
cuando voy en tu boca, demorada,
me desordeno, amor, me desordeno.


(Carilda Oliver Labra - Poetisa de Matanzas/Cuba, 1924)
Me desordeno, amor, me desordeno

Me desordeno, amor, me desordeno
cuando voy en tu boca, demorada;
y casi sin por qué, casi por nada,
te toco con la punta de mi seno.

Te toco con la punta de mi seno
y con mi soledad desamparada;
y acaso sin estar enamorada
me desordeno, amor, me desordeno.

Y mi suerte de fruta respetada
arde en tu mano lúbrica y turbada
como una mala promesa de veneno;

y aunque quiero besarte arrodillada,
cuando voy en tu boca, demorada,
me desordeno, amor, me desor
e toco con la punta de mi seno
y con mi soledad desamparada;
y acaso sin estar enamorada
me desordeno, amor, me desordeno.

Y mi suerte de fruta respetada
arde en tu mano lúbrica y turbada
como una mala promesa de veneno;

y aunque quiero besarte arrodillada,
cuando voy en tu boca, demorada,
me desordeno, amor, me desordeno

sábado, 13 de novembro de 2010

Poesia com notas musicais - Chico Cesar

Dona do Dom

Dona do dom que Deus me deu
Sei que é ele a mim que me possui
E as pedras do que sou dilui
E eleva em nuvens de poeira
Mesmo que às vezes eu não queira
Me faz sempre ser o que sou e fui

Eu quero, quero, quero, quero ser sim
Esse serafim de procissão do interior
Com as asas de isopor
E as sandálias gastas como gestos de um pastor

Presa do dom que Deus me pôs
Sei que é ele a mim que me liberta
E sopra a vida quando as horas mortas
Homens e mulheres vêm sofrer de alegria
Gim, fumaça, dor, microfonia
E ainda me faz ser o que sem ele não seria
Eu quero, quero, quero, é claro que sim
Iluminar o escuro com meu bustiê carmim
Mesmo quando choro
E adivinho que é esse o meu fim

Plena do dom que Deus me deu
Sei que é ele a mim que me ausenta
E quando nada do que eu sou canta
E o silêncio cava grotas tão profundas
Pois mesmo aí na pedra ainda
Ele me faz ser o que em mim nunca se finda

Eu quero, quero, quero, quero ser sim
Essa ave frágil que avoa no sertão
O oco do bambu
Apito do acaso
A flauta da imensidão


A FORÇA QUE NUNCA SECA

Já se pode ver ao longe
A senhora com a lata na cabeça
Equilibrando a lata vesga
Mais do que o corpo dita
Que faz o equilíbrio cego
A lata não mostra
O corpo que entorta
Pra lata ficar reta
Pra cada braço uma força
De força não geme uma nota
A lata só cerca, não leva
A água na estrada morta
E a força que nunca seca
Pra água que é tão pouca

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Café com Poesia

Paixão e encantamento não se explica, mas tem seus motivos. É um jeito de olhar e perceber... é encontrar aquele "quê" a mais que preenche de alguma forma nossas expectativas.
Eu sou uma apaixonada por Caxias do Sul e não é de hoje. Ás vezes penso em sair daqui não por amor a outra cidade e sim por amar e sentir saudade de pessoas que moram em outras cidades. Quando penso em fugir daqui penso que talvez a cidade não estranhe a minha ausência... eu sim, sentiria muito a sua falta.
Caxias é fria e, para mim, um tanto solitária. Só que sentir solidão aqui tem lá a sua beleza - diga-se de passagem, beleza gratuita.

Passear sozinha ou acompanhada pelo Parque dos Macaquinhos é muito prazeroso. Ali, em pleno centro da cidade, um enorme jardim. Paro e observo alguns homens jogando futebol na quadra, crianças pequenas no parquinho, uma jovem sentada na grama lendo um livro e ouvindo musica ao mesmo tempo, um casal caminhando na pista, namorados sentados como eu, mas ao invés de observarem as pessoas ao redor, preferem olhar um para o outro e riem à toa como se estivessem a sós. De longe eu só ouvia o barulho dos skates e bicicletas deslizando e batendo na pista que fica na parte alta do parque. A riqueza do parque é justamente essa de reunir pessoas tão diferentes e abrigar a todas, cada qual com suas particularidades.
E o frio, tão cruel e impiedoso, às vezes é só um pretexto para gente buscar abrigo e se juntar em algum dos cafés da cidade. Por alguns Reais voce pode desfrutar de um ambiente realmente aconchegante e acolhedor; tomar uma taça de café com leite e ter à sua disposição uma estante de livros composta basicamente de temas regionais, poesias, crônicas e fotografias.

Não há pressão pra voce desocupar a mesa, nem olhares contrangedores querendo te empurrar produtos, ainda que as guloseimas nas vitrines por si só ja sejam uma tentação.
A liberdade é sua de saber como quer aproveitar o tempo. Eu estava com fome de café com poesia.

O aperitivo:

Antecipação - Luciano Montauri de Moraes

Por que me dói a incisão antes do corte?
Por que me envenenas a visão antes do bote
e pára a pulsação antes da morte?
E se o que eu prevejo não ocorre
por que essa ressaca antes do porre?

Prato principal:

"... Te amarei nas melodias das geofrafias do mundo
de quando os dias sorriam a alegria que eu era". (Dolloris Maggione)

A Gulla:

"Antes que nasça o nunca..."
"Saudades batem pés pra não morrer de frio. (Dolloris)"

Saciada a minha fome, volto pra casa como amante satisfeita e durmo com cara de boba.

sábado, 9 de outubro de 2010

Casos e Casas

Amei aquela casa desde o primeiro momento em que a vi. Antes mesmo de entrar e conhecê-la melhor, ela ja exercia um fascinio sobre mim.
Ao me aproximar, sentia um misto de dúvida e expectativa: será que era o momento certo de encarar uma mudança? 
Da rua se via uma pequena varanda com canteiros ao seu redor, promessa de um jardim multicolorido.
A casa era simples e bonita, do jeito que eu gosto. O espaço interno era amplo e confortável, tinha uma lareira para aquecer  e embelezar as noites frias de inverno, uma banheira de hidromassagem no quarto principal, garagem dupla, uma churrasqueira excelente para reunir os poucos e bons amigos e, no pátio dos fundos, um enorme canteiro ja preparado para se plantar uma horta, paixão que eu herdei da minha mãe. Tudo se encaixava perfeitamente nos meus sonhos. E eu estava certa de que desejava fazer daquela casa o meu lar.
Meus olhos brilhavam diante da novidade e das possibilidades que ela trazia de felicidade.
Mudança feita, família instalada, a nova casa é comemorada como mais uma conquista.
Por um tempo acho que fui feliz desfrutando esses espaços e momentos íntimos com muita intensidade.
Comecei então a dedicar à minha nova casa boa parte do meu tempo, da minha energia, da minha criatividade, da minha paixão. Ela passou a fazer parte da minha vida e de todos os meus projetos. Era quase impossível me imaginar longe de casa e da segurança e proteção que ela me proporcionava.
Mas com o passar dos  dias algumas coisas foram ficando diferentes e eu nem sei explicar o momento exato em que tudo começou a mudar.
Eu olhava para a casa  e sabia que era a mesma... a lareira, o jardim, tudo permanecia ali como antes, mas nada era igual. Talvez eu estivesse diferente, o meu jeito de sentir e perceber o que estava ao meu redor ja não era o mesmo: a casa parecia exigente demais, necessitava de atenção e cuidados para ficar bem, para ser um lar. Eu ja não estava disposta a dedicar tanto do meu tempo a essas atividades corriqueiras do cotidiano. Não tinha motivação pra nada, nada me dava prazer. Parei de acender a lareira  e deixei o frio tomar conta do espaço e de mim. Parei de cuidar do jardim que em contrapartida encheu-se de ervas daninhas que sufocaram as flores, as cores e o perfume... um longo inverno se aproximava.
Qualquer tentativa que eu fazia de voltar ao que era antes me causava um tremendo cansaço e eu prontamente desistia.
Ao invés disso, preferi me afastar, sair de casa, respirar outros ares. Ja não havia sentido para ficar ali. Aquela casa que cabia perfeitamente nos meus sonhos, agora parecia pequena demais, estreita demais e não me permitia ver o horizonte.
 O certo é que nem todas as pessoas tem a capacidade de encontrar sentido e prazer no sonho quando esse se torna parte do seu cotidiano. Eu ainda não sei se o problema era meu ou da casa, também não estava disposta a pensar sobre isso e talvez ter que encarar uma profunda reforma.
O desejo, ao contrário do que se imagina, não se alimenta do encontro e o sonho não suporta a realidade... o próprio do desejo e do sonho é a busca.
Ao andar pelas ruas notei tantas casas diferentes até encontrar uma onde eu desejasse morar.
Meus olhos voltaram a brilhar novamente e eu fiquei fascinada com as possibilidades de felicidade que a nova casa poderia me proporcionar...
Bem, pessoas como eu podem até sonhar com a "casa própria", mas não se importam em pagar o preço do aluguel.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Finalmente a Primavera

Não, meu jardim não está lindo e florido, exceto por alguns copos de leite e por uma insistente orquidea que teima em florir no tempo certo, mesmo após um longo período de abandono e frio. Tampouco sou despertada com a barulheira da passarada ou com os raios de sol em minha janela. Também não arrumei tempo e coragem pra visitar o parque no fim de semana e  não encontrei o momento certo, aquele instante mágico, aquela sensibilidade que nos permite sentir o bom aroma das flores e plantas de longe. Eu sei que eles estão fluindo por aí, mas eu ainda não os senti.
Mas eu sei que a primavera chegou! E não li nos jornais ou fiquei atenta ao calendário.
Eu sei que a Primavera chegou porque ja não faz mais inverno em mim.
Benditas sejam as estações!!!

domingo, 5 de setembro de 2010

Retalhos

Eu me cubro de cores, desenho alegria
Rabisco poesia, questiono valores.
Escuto canções, crio ilusões,
Forjo decepções.
O que sinto não nego, mas também não entrego,
Não estou em liquidação.
Eu me rasgo e me refaço num talvez...
Corto, costuro, remendo, enlaço.
Sou corpo em pedaços
E em partes sou inteira
porque reconheço os tecidos que me fez.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Esquecer para lembrar

Um dos pontos fortes da Pedagia de Rubem Alves que norteia meus pensamentos neste momento é o conceito de des-construção. O momento é de des-construir (e não de desabar, espero). O momento é de esquecer para lembrar.
Para Rubem Alves somos o resultado de um feitiço colocado em nós pela nossa família, pelos educadores, pelo contexto social. E a função da psicanálise é justamente "ver cada corpo como um sapo dentro do qual está um príncipe esquecido. Seu objetivo não é ensinar nada. Seu objetivo é o contrário: des-ensinar o sapo sua realidade sapal. Faze-lo esquecer do que aprendeu, para que possa lembrar-se do que esqueceu."
Esquecer para lembrar...  exigência de todo processo de mudança e restruturação, de toda forma de aprendizagem e amadurecimento.
Depois de um longo período acostumados a uma determinada realidade ou situação, é comum termos dificuldade de nos imaginarmos vivendo de forma diferente. Como quem tenta redecorar a sala, mas não consegue imaginar cada mobília senão no mesmo lugar onde está, esgotamos as possibilidades do novo, do diferente, do inusitado e nos prendemos a determinados padrões de comportamento, repetimos certos vícios... nos tornamos previsíveis e pouco criativos. Porque mudanças fazem bagunça, tiram as coisas do lugar, geram num primeiro momento confusão, dúvidas, angústias... ansiedade. Exige rompimentos com velhos esquemas e paradigmas... por isso o novo nos assusta.
"Procuro despir-me do que aprendi, procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram, e raspar a tinta com que me pintaram os sentidos, desencaixotar minhas emoções verdadeiras, desembrulhar-me, e ser eu..." diz alberto Caieiro.
Esse eu que permanece e que alguns chamam de identidades é o que me refiro como raízes. Raízes no plural, como ramificações... diversos "eus" grávidos, cheios de vida, à espera do estímulo certo que o faça despontar, despertar e revelar-se de novo.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Inverno

O frio que se veste triste
Não cobre o vazio que existe
Na imensidão de mim.

O sussurro do vento la fora
Desperta as memórias
que eu faço adormecer.

As folhas pelo chão
são as marcas de um verão
que ja passou.

O céu se guarda no escuro
E eu me fecho em cortinas e muros
e espero o inverno passar.

domingo, 9 de maio de 2010

O Poder do Hoje - Por aluízio Vidal

É impressionante o poder que o hoje tem sobre nossa vida. Já sabemos disso, porém, muitas vezes nos deixamos aprisionar pelo ontem e somos tentados a imaginar que somos determinados por ele.

Aquilo que nos aconteceu ontem, tenha sido bom ou ruim, ficou para trás e já não é, entretanto, frequentemente experimentamos no presente um fato do passado como se hoje fosse. Quando a experiência foi positiva, carregamos a boa lembrança, e quando foi negativa, carregamos a dor ou mesmo o trauma.

Importante se faz pensar que dor do passado que se dói no presente não é dor do passado, é dor do presente, portanto, sou responsável por mantê-la, não é ela quem determina sobre mim, sou eu quem determino sobre ela, sou eu quem tomo a decisão de mantê-la viva e não posso mais considerá-la algo do passado.

É frequente que nós pessoalmente, e até mesmo algumas linhas da psicologia, insistimos em tentar explicar o presente por algo que aconteceu no passado, daí, como não sou capaz de mudar o passado, passo a ser escravo do que aconteceu. Não, isso não precisa ser assim, posso agir emocionalmente hoje para tomar uma nova postura e modificar o que estou sentindo.

Da mesma maneira, algo que foi muito bom ontem pode ser lembrado hoje com o mesmo sentimento e posso me permitir à saudade e fazer disso um fato estimulador daquilo que vivo hoje, mas não posso querer que a experiência de hoje seja a mesma do passado. O hoje é livre para ser construído e reconstruído a cada dia.

Alguém já disse: O passado é história, o futuro é mistério e o hoje é dádiva, por isso se chama presente. Pois é, que o hoje seja celebrado como o espaço da vida e que nossas decisões continuem nos chamando ao fato de que somos os terapeutas de nós mesmos.

http://praluizio.blogspot.com/

domingo, 2 de maio de 2010

Dona de mim

Dona de mim, presa do amor

Vou inventando os sonhos meus

Reinventando os meus e os teus

Redescobrindo quem eu sou.

Quando nós não existimos

Nem nos textos, nem nas falas

Nós estamos no avesso

Nas entrelinhas que não calam.

Não fomos enquadradas na tua sala

Somos raras, mas não tão raras

Pra caber nas tuas molduras caras.

Quadros, molduras e fôrmas

Formas de se definir alguém

e se reduzir também.

Dona de mim sou ... presa do amor vou

Vivendo a liberdade em meias verdades ...

Entre riso e dor, viver na contradição, Se eu estou na contramão, na mão de quem você está?

Vou seguir pelas

curvas das estradas, pelas esquinas não sinalizadas

E quando tudo parecer incerto... até mesmo o meu amor

Ainda assim, quero acreditar que sou

Dona de mim.

terça-feira, 27 de abril de 2010

O Poder dos Fatos

Escrevi antes sobre o poder das Palavras e agora me coloco a pensar sobre o poder dos fatos... alguns acontecimentos nos surpreendem de tal maneira, positiva ou negativamente, que contra eles nos sentimos impotentes. A clássica frase: é fato, não tem como negar, não há o que fazer.
Quem nunca desejou em algum momento que sua vida fosse como um filme... lembrei-me de vários deles agora: Click, Efeito borboleta, Como se fosse a primeira vez, De volta para o Futuro... filmes cujos personagens em determinado momento voltam no tempo e tomam decisões diferentes (aparentemente insignificantes até) e mudam todo desfecho da trama.
Diariamente tomamos milhares de decisões e caminhamos rumo ao desconhecido. Imaginamos, sonhamos, planejamos como se tivéssemos o controle dos acontecimentos em nossas mãos, até sermos surpreendidos por um fato, um acontecimento não esperado.
Destino? Não me conforta. O que me importa crer que tudo está pré-determinado se o que está pré-determinado eu desconheço e preciso igualmente decidir o que fazer, pra onde ir, onde quero chegar.
Nas alegrias da vida me compete ficar com o mérito: eu decidi sair de casa, eu optei por este curso, nós decidimos nos casar, Deus (no máximo) me ajudou...
São nos momentos de tristeza e dor, quando sentimos o peso das nossas escolhas sobre nossos ombros, quando sentimos que estamos perdidos sem saber pra onde ir, que recorremos à divindade: era pra ser assim; Deus quis assim; tudo tem um objetivo, nada acontece por acaso; é o destino que Deus traçou pra mim; ou na pior hipótese, estou pagando pelos erros que cometi numa outra encarnação (erro esse que desconheço e nem me compete pedir perdão, apenas aceitar e pagar nesta vida).
Alguns comentários coloquiais que ouço por aí me preocupam: "as pessoas não mudam mesmo"; "Filho de peixe, peixinho é"; "fez uma vez vai fazer sempre"; "o amor não muda as pessoas"; "pau que nasce torto nunca se endireita ... assim parece fácil julgar as pessoas... Só me pergunto se eu estou entre as "sem solução" ou as "incapazes de errar"? Ou somos julgados/as por tema: gosto de estudar e sempre gostarei, sou fiel e sempre serei, roubei uma vez e sempre serei ladra, menti e por isso estou condenada à mentira... é assim que funciona?
Não tenho o controle dos fatos em minhas mãos, isso atesta a fé cristã, mas tenho escolhas a fazer diante dos fatos, ainda que eu não saiba exatamente aonde essas escolhas me levarão...
Não posso escolher/determinar tudo ao meu redor. Mas escolho em que direção quero seguir.
Diante de mim há um horizonte que me orienta, que ao olhar para ele reconheço quem eu sou e ajuda quando me sinto perdida, sem rumo.
No meu horizonte eu vejo flores porque não abandono as boas sementes, eu vejo a paz, porque não alimento o ódio e busco a reconciliação, eu vejo amor porque carrego ele comigo e esse não me há de faltar, eu vejo grandes encontros porque procuro pelo abraço e prefiro não caminhar sozinha. Eu vejo Deus cujo poder de atração me leva para junto dele mesmo quando pareço distante... Ela me toma em seus braços, cura as feridas do meu caminhar, alivia o meu cansaço e me da de comer. Como criança pequena eu me vejo adormecer em seus laços, no conforto do seu colo encontro a minha paz (cf. Os 11.4).

quarta-feira, 21 de abril de 2010

O Poder das Palavras

Herdei da teologia, principalmente das conversas com as teólogas feministas, esse gosto pelas palavras, esse olhar para as palavras como geradoras, parideiras de mundos. Palavras tem poder - são feitas de magia e bruxaria, pragas e encantos. Sempre foi assim, segundo a Bíblia, antes de todas as coisas havia a Palavra Criadora, o Verbo, a Sabedoria.
"Palavras apenas, palavras pequenas, palavras..."
Tenho várias caixinhas recheadas de palavras que recebo ou encontro por aí e vou guardando, algumas aleatóriamente, porque são livres demais para se encaixar nas minhas categorias, outras não dão trabalho algum, é só colocar na caixinha padrão, etiquetar e usar conforme a conveniência. São fáceis de achar por aí, todo mundo usa.
Tenho uma linda coleção de palavras, algumas me são tão preciosas que raramente ouso pronunciá-las. As palavras brilhantes e alegres estão criando mofo e preciso colocá-las para fora mais vezes... Já as apaixonadas e carinhosas parecem desgastadas rsrssrsrrsr, talvez precisam ganhar uma cor diferente (ando com essa mania de querer pintar e reformar tudo aqui em casa, mas tem coisas que não tem jeito, só trocando por novas mesmo).
Como eu disse, tenho guardadas muitas palavras... palavras musicais, palavras novas, mais antigas, estrangeiras, de todos os tamanhos, bonitas, feias, simples e complexas, palavras sagradas e profanas, também tenho algumas palavras estranhas... mas o que tem me preocupado mesmo é a maneira como venho usando essa coleção, com quais caixinhas tenho brincado, quais tenho aberto e pronunciado.
Algumas palavras são muito perigosas e podem ferir profundamente. Não sou a única que conhece esse tipo de palavras, basta soltar uma e voce ja recebe em troca diversas outras... chega ser engraçado, se não fosse triste.
As palavras ditas e ouvidas no momento de raiva ganham intensidade maior e produzem ecos que dificultam a ação do elixir do esquecimento. Uma vez ditas não se pode colocá-las nas caixinha como se nada tivesse acontecido. Elas têm vida própria e pintam realidades para além daquela que se desejava expressar ou se sentia ao dizer. Ao serem pronunciadas registram na memória o som e a imagem daquele instante e ficam guardadas ali até que outras palavras sejam colocadas sobre elas e ocupem o seu lugar. Tudo é uma questão de tempo e de espaço e cada colecionador pode escolher a palavra que quer guardar.
Tenho aprendido às duras penas que amar muito alguém e querer bem a essa pessoa não significa ver o mundo da mesma maneira e que ter um objetivo comum não significa que há consenso quanto à forma de alcançar esse objetivo... as diferenças que enriquecem e aproximam as pessoas, também causam um tremendo cansaço, desgastam as relações e as palavras, causam dor.
Haja tempo para cicatrizar as feridas, haja tempo para tornar a memória e as palavras doces novamente, como foram um dia.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Ventos de Outono

"O vinho molha e tempera os espíritos e acalma as preocupações da mente...ele reaviva nossas alegrias e é o óleo para a chama da vida que se apaga. Se você bebe moderadamente em pequenos goles de cada vez, o vinho gotejará em seus pulmões como o mais doce orvalho da manhã...Assim, então, o vinho não viola a razão, mas sim nos convida gentilmente à uma agradável alegria." (Sócrates)

Gosto do outono porque ele tem seus mistérios. É quando as plantas e os animais mudam sua roupagem, trocam de cor, concentram suas energias no que é essencial para a sobrevivência na próxima estação. Os galhos vazios, as folhas secas nos parques, o vento frio nas manhãs e fim de tarde comunicam que o inverno se aproxima.

As pessoas também acabam criando seus rituais de preparação para receber o inverno. A previsão do tempo anuncia as primeiras frentes frias e nós vamos tirando dos roupeiros os cobertores, os blusões de lã (alguns cheirando a mofo ainda), os casacos. Lembramos de comprar lenha pros fogões e lareiras antes que o frio aumente e o preço da lenha suba na mesma proporção e, claro, substituímos a cerveja (para alguns, sinônimo de férias e verão) pelo nosso bom vinho de cada dia.

Nada se compara ao prazer desses primeiros dias frios – pela saudade que muda nossas sensações e nos tira do campo racional (nem nos deixa pensar nos transtornos que o frio causa na vida da gente) e porque é parte importante do jeito caxiense de ser.

Não tem como imaginar a vida aqui sem o frio, sem os parrerais, sem os vinhos e espumantes que alimentam a economia e a cultura da região, sem os queijos coloniais e as massas caseiras servidas das mais variadas formas, e sem o cheiro da fumaça das chaminés que deixa as noites ainda mais nubladas e misteriosas reforçando as características interioranas dessa grande cidade.

Eu aprendi a amar o outono e a aceitar o inverno com sua beleza e rigidez típicas. Esse ano quero seguir à risca o rito outonal: também quero desprender-me de algumas folhas secas e soltá-las ao vento, quero cuidar daquilo que me é essencial nas noites frias da vida, alimentar o que me sustenta e me permite brotar em novas estações, quero manter o corpo e a casa aquecidos para ser aconchego e morada.


Lise e Aluizio, Abraço por estarem comigo neste espaço que ainda me é “estranho”, mas gosto.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

ESPELHOS

Eu queria ter o hábito de usar óculos

Já insisti, por necessidade.

Troquei os velhos (sem ao menos serem usados) por modelos mais modernos pra ver se me adaptava:

Óculos de grau, óculos de sol, óculos de sol com grau...

Todo esforço em vão.

Realmente tem dias que lamento esse meu fracasso.

E tenho que confessar que invejo as pessoas

Que sacam de seus óculos escuros e saem elegantemente

Desfilando sorrisos por aí...

Voce já reparou que quem usa óculos costuma andar de cabeça erguida?

Simples, óculos são delicados e custam caro. Ninguém deseja ter que

resgatá-los do chão.

Usar óculos exige mesmo uma certa disciplina, limpar, cuidar.

Dizem que quem usa óculos atrai todas as atenções para a boca, para o sorriso

Bocas e olhos são bastante expressivos, porém são diferentes. Enquanto as bocas expressam o superficial e atiçam a fantasia, os olhos são como duas janelas que convidam a olhar para dentro. São conhecidos também como espelhos da alma.

Têm dias que me incomoda profundamente sair de casa com a alma exposta.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Pra começar...

Adicionar vídeo
Há tempo venho falando em criar um blog pra poder expresssar algumas idéias, opiniões, falar das coisas que tenho visto, vivido, pensado quando bate aquela insônia. Quero que seja uma motivação também para eu buscar coisas diferentes, (re)ler livros guardados na estante e fazê-los novamente parte do meu cotidiano.
No mais, tudo é pretensão e necessidade mesmo.

Necessidade de fazer uma leitura dos acontecimentos rotineiros, trocar informações, afinar os ouvidos, jogar purpurina nas coisas opacas, colorir os ambientes, adubar as plantas e as idéias pra ver algo bonito, inesperado florescer... percebo que a adaptação à realidade é ruim, melhor é não se adaptar, não acostumar o olhar, não domesticar o paladar, ...

Vive dentro de mim uma eterna insatisfeita... ouvi isso hoje e agora, só agora me dei conta como isso é libertador. Sei que não sou a insatisfeita rabujenta, só não nego minha origem protestante, questionadora.
Voces viram que por aí vai né? Voltamos a esse assunto num outro momento porque esse papo aqui é só pra começar mesmo.
Como sou nova nisso, preciso descobrir as ferramentas que tenho disponíveis pra tornar esse cantinho mais aconchegante.
Buenas