domingo, 5 de junho de 2011

ah, o amor e seus ideais... Parte II

   Gosto das teorias como gosto de tudo que tenta definir o indefinível, descrever o indescritível ou explicar o inexplicável... gosto da ousadia e da presunção de quem tenta captar algo e criar categorias. E gosto mais ainda de quem usa seus conhecimentos para desconstruir ou relativizar àquelas, fazendo surgir novos conceitos ou pontos de vista. Assim como a pedra lançada na água que faz surgir um círculo após o outro sucessivamente.
   Foi esse espírito curioso, voltado às coisas mundanas e corriqueiras que me levou a conhecer um pouquinho da teoria do Anarquismo Somático ou Somaterapia, defendida por Roberto Freire em 20 anos de terapia e descritas nos seus livros "A alma é o Corpo" e "Ame dê Vexame".
   A palavra Soma é usada para descrever a totalidade do ser humano em suas extensões físicas, afetivas, sensuais, cognitivas e também sexuais. Em outras palavras, Soma é o ser humano visto na sua integralidade, na sua forma plena. Soma ou Somaterapia é uma prática terapêutica corporal e em grupo, baseado na obra de Wilhelm Reich, que visa a recuperação de pessoas submetidas a repressão autoritária. Como repressão autoritária compreende-se toda forma de poder que tira do individuo a sua liberdade pessoal de pensar e agir conforme sua própria natureza humana e ecológica.
   A Soma tenta desconstruir a idéia circular de que o amor rima com dor e combate a Ideologia do Sacrifício, segundo ele, sustentadas pelas religiões judaico-cristãs, pelo Marxismo e pela própria psicanálise. Para os adeptos dessa linha de pensamento o principal conflito das pessoas é a relação entre liberdade versus autoritarismo, ou seja, garantida a liberdade pessoal, os problemas afetivos, sexuais, criativos e produtivos desaparecem.
   Em uma entrevista Roberto Freire comenta de que forma suas teorias marcam sua forma de relacionar-se: "Fico totalmente apaixonado pela pessoa que está ao meu lado, na hora que estou com ela. E acontecem sempre coisas fortes e bonitas. E ficamos juntos o tempo que for bom para nós. Preciso de pessoas que não me cobrem fidelidade, nem continuidade, nem exclusividade.Gosto do namoro, do encontro, que propicia sexualidade original, lúdica, alegre, descartável. Assim, a gente vive em permanente estado de descoberta, surpresa e encantamento."
   Enquanto o ideal de amor romântico dos contos de fadas e novelas terminam sempre com um "... viveram felizes para sempre", o ideal de amor anarquista pressupõe a liberdade de escolha que é altamente temporal, presente, cotidiana e momentanea.
Os vínculos existem somente enquanto há interesse de ambas as partes, sem perspectivas para um depois. Com todo esse despreendimento, engana-se quem pensa que a Somaterapia é a cura para todas as "dores de cotovelo" ou "ressacas de amor". Esses anarquistas também convivem com a dor da ausência, dos "nãos" recebidos e principalmente com a solidão. Mas a ausência do outro não é entendida como perda, uma vez que não existe o sentimento de posse ou propriedade.
   Dois grandes expoentes do amor anarquista foram, além de Reich, David Cooper e Fritz Perls, dos quais Freire se reconhece como discípulo.
   É de Perls um dos textos mais conhecidos que circula pela internet e que tem como fundamento essa idéia do amor anarquista e libertário, que se chama Oração da Gestalt:

"Eu faço as minhas coisas
e você faz as suas.
Não estou neste mundo
para satisfazer as suas expectativas
e você não está neste mundo
para viver conforme as minhas.
Você é você,
eu sou eu.
E se por acaso nos encontrarmos
será maravilhoso.
 E se não,
 não há nada a fazer.

   Um texto anônimo, escrito por um dos clientes de Roberto Freire, acrescenta à essas, outras idéias, como variações sobre um mesmo tema:

"Se eu faço unicamente o meu
e tu o teu
corremos o risco de perdermos
um ao outro e a nós mesmos
Não estou neste mundo para preencher tuas expectativas
mas estou neste mundo para me confirmar a ti como um ser humano único
para ser confirmado por ti
Somos plenamente nós mesmos
Somente em relação um ao outro.
Eu não te encontro por acaso
Te encontro mediante uma vida atenta
em lugar de permitir que as coisas me
aconteçam passivamente
Posso agir intencionalmente para que aconteçam
Devo começar comigo mesmo, verdade,
mas não devo terminar aí: a verdade começa a dois".

Casamentos, fidelidadade, cobranças, ciúmes, pactos e promessas são vistos como "neuroses" de uma sociedade autoritária e burguêsa.
   Você concorda ou tem uma teoria diferente?







  

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