quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Café com Poesia

Paixão e encantamento não se explica, mas tem seus motivos. É um jeito de olhar e perceber... é encontrar aquele "quê" a mais que preenche de alguma forma nossas expectativas.
Eu sou uma apaixonada por Caxias do Sul e não é de hoje. Ás vezes penso em sair daqui não por amor a outra cidade e sim por amar e sentir saudade de pessoas que moram em outras cidades. Quando penso em fugir daqui penso que talvez a cidade não estranhe a minha ausência... eu sim, sentiria muito a sua falta.
Caxias é fria e, para mim, um tanto solitária. Só que sentir solidão aqui tem lá a sua beleza - diga-se de passagem, beleza gratuita.

Passear sozinha ou acompanhada pelo Parque dos Macaquinhos é muito prazeroso. Ali, em pleno centro da cidade, um enorme jardim. Paro e observo alguns homens jogando futebol na quadra, crianças pequenas no parquinho, uma jovem sentada na grama lendo um livro e ouvindo musica ao mesmo tempo, um casal caminhando na pista, namorados sentados como eu, mas ao invés de observarem as pessoas ao redor, preferem olhar um para o outro e riem à toa como se estivessem a sós. De longe eu só ouvia o barulho dos skates e bicicletas deslizando e batendo na pista que fica na parte alta do parque. A riqueza do parque é justamente essa de reunir pessoas tão diferentes e abrigar a todas, cada qual com suas particularidades.
E o frio, tão cruel e impiedoso, às vezes é só um pretexto para gente buscar abrigo e se juntar em algum dos cafés da cidade. Por alguns Reais voce pode desfrutar de um ambiente realmente aconchegante e acolhedor; tomar uma taça de café com leite e ter à sua disposição uma estante de livros composta basicamente de temas regionais, poesias, crônicas e fotografias.

Não há pressão pra voce desocupar a mesa, nem olhares contrangedores querendo te empurrar produtos, ainda que as guloseimas nas vitrines por si só ja sejam uma tentação.
A liberdade é sua de saber como quer aproveitar o tempo. Eu estava com fome de café com poesia.

O aperitivo:

Antecipação - Luciano Montauri de Moraes

Por que me dói a incisão antes do corte?
Por que me envenenas a visão antes do bote
e pára a pulsação antes da morte?
E se o que eu prevejo não ocorre
por que essa ressaca antes do porre?

Prato principal:

"... Te amarei nas melodias das geofrafias do mundo
de quando os dias sorriam a alegria que eu era". (Dolloris Maggione)

A Gulla:

"Antes que nasça o nunca..."
"Saudades batem pés pra não morrer de frio. (Dolloris)"

Saciada a minha fome, volto pra casa como amante satisfeita e durmo com cara de boba.

sábado, 9 de outubro de 2010

Casos e Casas

Amei aquela casa desde o primeiro momento em que a vi. Antes mesmo de entrar e conhecê-la melhor, ela ja exercia um fascinio sobre mim.
Ao me aproximar, sentia um misto de dúvida e expectativa: será que era o momento certo de encarar uma mudança? 
Da rua se via uma pequena varanda com canteiros ao seu redor, promessa de um jardim multicolorido.
A casa era simples e bonita, do jeito que eu gosto. O espaço interno era amplo e confortável, tinha uma lareira para aquecer  e embelezar as noites frias de inverno, uma banheira de hidromassagem no quarto principal, garagem dupla, uma churrasqueira excelente para reunir os poucos e bons amigos e, no pátio dos fundos, um enorme canteiro ja preparado para se plantar uma horta, paixão que eu herdei da minha mãe. Tudo se encaixava perfeitamente nos meus sonhos. E eu estava certa de que desejava fazer daquela casa o meu lar.
Meus olhos brilhavam diante da novidade e das possibilidades que ela trazia de felicidade.
Mudança feita, família instalada, a nova casa é comemorada como mais uma conquista.
Por um tempo acho que fui feliz desfrutando esses espaços e momentos íntimos com muita intensidade.
Comecei então a dedicar à minha nova casa boa parte do meu tempo, da minha energia, da minha criatividade, da minha paixão. Ela passou a fazer parte da minha vida e de todos os meus projetos. Era quase impossível me imaginar longe de casa e da segurança e proteção que ela me proporcionava.
Mas com o passar dos  dias algumas coisas foram ficando diferentes e eu nem sei explicar o momento exato em que tudo começou a mudar.
Eu olhava para a casa  e sabia que era a mesma... a lareira, o jardim, tudo permanecia ali como antes, mas nada era igual. Talvez eu estivesse diferente, o meu jeito de sentir e perceber o que estava ao meu redor ja não era o mesmo: a casa parecia exigente demais, necessitava de atenção e cuidados para ficar bem, para ser um lar. Eu ja não estava disposta a dedicar tanto do meu tempo a essas atividades corriqueiras do cotidiano. Não tinha motivação pra nada, nada me dava prazer. Parei de acender a lareira  e deixei o frio tomar conta do espaço e de mim. Parei de cuidar do jardim que em contrapartida encheu-se de ervas daninhas que sufocaram as flores, as cores e o perfume... um longo inverno se aproximava.
Qualquer tentativa que eu fazia de voltar ao que era antes me causava um tremendo cansaço e eu prontamente desistia.
Ao invés disso, preferi me afastar, sair de casa, respirar outros ares. Ja não havia sentido para ficar ali. Aquela casa que cabia perfeitamente nos meus sonhos, agora parecia pequena demais, estreita demais e não me permitia ver o horizonte.
 O certo é que nem todas as pessoas tem a capacidade de encontrar sentido e prazer no sonho quando esse se torna parte do seu cotidiano. Eu ainda não sei se o problema era meu ou da casa, também não estava disposta a pensar sobre isso e talvez ter que encarar uma profunda reforma.
O desejo, ao contrário do que se imagina, não se alimenta do encontro e o sonho não suporta a realidade... o próprio do desejo e do sonho é a busca.
Ao andar pelas ruas notei tantas casas diferentes até encontrar uma onde eu desejasse morar.
Meus olhos voltaram a brilhar novamente e eu fiquei fascinada com as possibilidades de felicidade que a nova casa poderia me proporcionar...
Bem, pessoas como eu podem até sonhar com a "casa própria", mas não se importam em pagar o preço do aluguel.